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A caminho de Santiago

O relato das minhas aventuras pelos Caminhos de Santiago

A caminho de Santiago

O relato das minhas aventuras pelos Caminhos de Santiago

Dia 03 - Caminho Francês de Santiago

27.09.10, daraopedal

Por volta das 6h30, começaram a fazer barulho. Acho que o Japonês foi o 1º a levantar-se, pelo menos foi o 1º a partir. Pelas 7h15 (+/-) levantei-me e acomodei as tralhas todas nos alforges. Chegámos rapidamente a Pamplona, onde entrámos por uma porta enorme, na zona das muralhas.

Passámos pela catedral, em obras, e fomos ao albergue para carimbar as credenciais.

Era enorme e parecia ser bem interessante. Depois seguimos pela zona da Universidade de Navarra.

Aí começou a chover e lá tivemos de voltar aos impermeáveis. Logo à saída da cidade, vimos uma mulher com uma criança de 5/6 anos pela mão.

A mãe carregava uma mochila e ia chamando a miúda que não estava com grande vontade de caminhar. Fiquei a pensar nas razões que levam uma mãe a sujeitar uma miúda a tamanho esforço. Afinal, ela não chega a "viver" o caminho, nem entende o seu significado e provavelmente, passado pouco tempo, nem se lembrará do que viu e por onde passou. Também é certo que não sei se iam fazer o caminho na totalidade, mas ainda assim... Adiante vimos um homem de mochila às costas e com outro miúda pela mão. Seria o resto da família? Finalmente começámos a seguir em direcção à serra do Alto del Perdon.

Eram imensos os peregrinos que se viam no caminho subindo em direcção às eólicas. Pensei inicialmente que íamos mesmo até ao ponto mais alto, mas afinal não; o monumento ao peregrino está do lado direito de uma fileira de torres eólicas.

 

A ventania também era tal que mal chegámos ao alto tivemos de vestir os casacos. Tirámos as fotos da praxe. Iniciámos então a descida muito técnica e dura devido às pedras parecidas com seixos redondos e escorregadios.

O meu travão de trás começou a chiar bastante, mas foi travando. A dificuldade maior foi mesmo ultrapassar tanto peregrino a pé. Perdi a conta às vezes que disse "Perdon", "Gracias". Que falta me faz a minha pequena campainha! Rapidamente chegámos a Puente de la Reina. Parámos junto a uma estátua do peregrino e carimbámos no albergue logo ali ao lado.

Fomos então até ao centro, um pouco ao acaso porque perdemos sinal das marcas, mas como estávamos na calle Mayor, em direcção à ponte, devia ser mesmo por ali.

Tirámos as fotos da praxe na zona da ponte.

 

Voltámos para trás, para almoçar junto à praça. Logo a seguir a Puente de la Reina apanhámos uma forte subida, ainda por cima com bastante calor, no entanto o local era bem bonito, com uns pinheiros e encostas bem engraçados até chegar à autovia.

Na rede de separação, os peregrinos tinham colocado cruzes feitas de paus. Numa descida entre vinhedos, avistámos uma pequena aldeia chamada Cirauqui.

Fiquei encantado com a sua beleza pitoresca. Subimos a encosta até ao centro onde existe um arco num edifício pelo qual temos de atravessar. Na descida há uma calçada romana, bem desagradável para pedalar, mas interessante a descobrir. Tivemos de transpor uma ponte em ruínas e continuámos pela calçada romana. É difícil pedalar pela calçada porque as pedras estão lisas e escorregadias e os alforges andam sempre aos saltos. Passámos uma e outra vez debaixo da A12, numa jornada em que o vento acabou por ser o nosso (indesejado) companheiro, o que tornou o resto da etapa algo desagradável.

Assim, quando avistámos Estella, já só queríamos ficar por lá.

Optámos pelo albergue paroquial, situado num edifício recente (tipo apartamento). As bicicletas tiveram de ficar fora, amarradas na rua visto que não havia espaço dentro, o que me desagradou um pouco.

 

Estivemos também com um senhor chamado José António Garcia, que tem a particularidadee de ter feito perto de 97 000 km pelo mundo em peregrinação, como forma de agradecimento à virgem por ter sobrevivido a um naufrágio em mar alto na Noruega. Esse senhor era pescador e o seu barco naufragou, tendo sido o único sobrevivente. Esperou 9h entre cadáveres até ser resgatado, e esteve quase um ano em recuperação, mas desde aí percorreu muitos dos lugares considerados altares do mundo. Conheceu o Papa João Paulo II e o Daila Lama. Já esteve no Tibete, Índia, Nepal, Sibéria, África, Canada, China, Israel e Equador. Tinha também já passado por Portugal: no Porto tinham-lhe roubado a bicicleta, a mochila e o dinheiro e depois, chegado a Fátima e sem comer havia já dois dias, pediu esmola a um padre. Segundo nos disse, a resposta do padre foi que Jesus Cristo tinha andado 40 dias no deserto sem comer, portanto ainda podia aguentar mais 38. Até senti vergonha da imagem que ele levou do nosso país. Estava agora a regressar de Santiago de Compostela, indo para S. Sebastian, onde ia encontrar a sua família e conhecer netos que nunca tinha visto. Um feito, sem dúvida! O jantar foi em comum.

Conversámos com uma francesa que fazia o caminho aos poucos havia já uns anos, e uma espanhola que, como nós, andava a fazer o caminho de bicicleta e até com um português que chegou ao albergue depois de nós na companhia de um grupo de italianos. Havia polacos, ingleses, americanos, espanhóis, italianos, franceses e portugueses. Hoje fizemos 54.47 km em 5h11min a uma média de 10.93 km/h. Total 123 km. Ainda a procissão vai no adro...